Professor de informática cria mouse adaptado para aluna com deficiência

24/07/2013 09:55
De acordo com o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 45,6 milhões de brasileiros declaram ter algum tipo de deficiência, sendo que 2,5 milhões deles têm entre 4 e 17 anos, ou seja, estão em período escolar e encontram barreiras para estudar. De olho nessas estatísticas, jovens desenvolvem ferramentas como o HandTalk e o Que Fala, aplicativos para celular que buscam auxiliar o acesso à escola dessas crianças e jovens.
 
O HandTalk, por exemplo, vencedor do prêmio WSA-Mobile, promovido pela ONU, é um aplicativo para tablets e celulares que traduz em tempo real, qualquer palavra ou frase, em português, para Libras (Língua Brasileira de Sinais).
 
Para Ronaldo Tenório, um dos fundadores da ferramenta, o uso da tecnologia pode ser um passo para o acesso de crianças com deficiência auditiva nas escolas que, apesar do crescimento no número de matrículas, continua baixo. No ano 2000, última contagem oficial sobre o assunto, o IBGE mostrou que a população de surdos com idade escolar ultrapassava os 350 mil. Em 2010, dez anos depois, o Censo Escolar apontou que apenas 70 mil estavam devidamente matriculados nas escolas.
 
Além de auxiliar no processo de inclusão de jovens com deficiência, esse tipo de tecnologia permite um aprendizado em duas vias. `A plataforma é útil para alunos surdos, para que eles possam frequentar a escola da maneira adequada. Com a solução implementada nas escolas, além de estimular esse aluno com deficiência, será um incentivo para seus colegas aprenderem Libras e estreitar o relacionamento entre eles`, explica.
 
Mônica Pereira dos Santos, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e membro da Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial, considera algo `super positivo` esse engajamento dos jovens para o desenvolvimento de tecnologias para a acessibilidade, mas ressalta que seu impacto depende de como esta tecnologia vai ser adotada pela escola e seus profissionais.
 
`Inclusão é assunto de culturas e políticas públicas, para além das práticas. Uma ferramenta, sozinha, não dá conta do recado. Há que haver uma mobilização da comunidade escolar no sentido de rever suas posturas e valores (culturas) e tomar decisões que reorientem seu dia a dia em um sentido mais favorável a inclusão (políticas)`, diz.
 
Para ela, uma das maneiras de obter sucesso com essas tecnologias é por meio de uma formação continuada dos professores que, segundo ela, ainda é a maior barreira que faz com que muitas tecnologias `emperrem` na sala de aula. `[As escolas] podem ajudar convidando os pais a conhecerem o trabalho com as tecnologias que é feito com seus filhos para que, quem sabe, eles possam reforçá-lo sempre que possível`, explica.
 
O professor de informática Jair Oliveira Junior, 34, da cidade paranaense de Nova Esperança (460 km de Curitiba), desenvolveu um mouse adaptado para que uma de suas alunas pudesse acompanhar melhor as aulas. Michelle Aparecida Peixoto, 27, teve paralisia infantil e apresentava dificuldades para usar o mouse tradicional. O custo do aparelho, feito com material reciclado, foi menos de R$ 50.
 
Há um ano e meio, o professor percebeu que a estudante tinha dificuldades para participar do curso técnico em administração e informática do Colégio Estadual São Vicente de Paula. Passados alguns meses, Oliveira decidiu pesquisar equipamentos de computação para deficientes e só encontrou peças caras.
 
`Nunca tinha trabalhado com pessoas como a Michele. Achei dispositivos adaptados, mas custava entre R$ 800 e R$ 1.000, valor alto demais para as condições do projeto. Falei que iria fazer um com as próprias mãos. O pessoal achou que era brincadeira, mas em três dias já estava criado o mouse`, explicou Oliveira.
 
O professor, que faz mestrado em tecnologia da informação, detalhou o processo de criação do equipamento. Com peças velhas de impressoras do colégio, madeira doada por uma loja de móveis e pedais de máquina de costura de uma empresa do ramo, Oliveira juntou fios, roldanas e cabos em uma caixa. Os pedais funcionam como botões direito e esquerdo. `Achei a ideia muito legal. Descobri que não era eu, mas a máquina que não estava preparada para mim`, disse Michele, agora animada com o mundo da informática.
 
Com o diploma do curso técnico conquistado no mês de junho, a estudante pretende fazer vestibular na UEM (Universidade Estadual de Maringá). `Moro com minha irmã de 17 anos e minha mãe, que não pode trabalhar porque precisa cuidar de mim. Quero fazer uma faculdade fora de Nova Esperança e ajudar as duas`, planeja. A família vive apenas da pensão concedida pelo Governo Federal.
 
O professor conta que ficou satisfeito com o resultado e segue preparando mais uma invenção: um teclado adaptado. `Já estou montando o equipamento com base em acrílico. Tudo tem que ser de material barato. Tem que ser acessível pra quem precisar usar`, afirmou Oliveira, que não pretende patentear os equipamentos: `Quero que o pessoal copie, que melhore a ideia. Precisamos mesmo é ajudar mais pessoas`.
 
Fonte: Deocélia/UOL Educação